Ser normal não é natural (1)

domingo, 5 de dezembro de 2010

Como o povo é engraçado com essa mania de copiar! Um cópia o outro. Parece que Deus não deu ao homem o poder da criação. Mas cada um é si mesmo. Cada um é, na verdade, um universo, um jeito próprio de falar, de se mexer, uma cabeça, uma sentença. Cada um é uma cara, mas o povo faz uma força para ficar com a mesma cara, vestir as mesmas roupas, fazer tudo igual. 
É uma coisa engraçada o ser humano. Vocês não acham? 
A natureza trabalha pela originalidade e o homem trabalha pela ilusão da igualdade, porque acha que tem que ser igual, porque não quer ser diferente. Ao mesmo tempo em que, de vez em quando, ele quer ser especial para ser melhor do que os outros. Mas não quer ser diferente, não. Quer ser igual. Um imita o outro, fala igual ao outro, faz igual ao outro, quer comprar a roupa que o outro comprou, quer comprar o carro que o outro comprou. É de uma pobreza! 
O homem podia ser tão mais colorido, trazendo de dentro de si a sua originalidade. Mas todo mundo esconde. Morre de medo de mostrar uma coisinha diferente. "Ai, que loucura!" Tem medo de parecer louco: 
- Eu faço isso, mas isso aqui é normal. 
Ah, minha gente, que doença! Você é normal, minha filha? Você, então, é doente. Eu sinto muito, porque você está contra a sua natureza. A natureza não é normal, não! Ela faz cada um com uma cara, faz cada um de um jeito. E aí vem vocês dizer que está errado, que vocês têm que ser tudo igual. Falam igual, comem igual, pensam igual. Que coisa mais triste! E tem gente sofrendo nesse mundo só porque quer ser igual. Não é uma coisa engraçada o ser humano? Sofre porque, na verdade, fica contra si, se sente esquisito, um marginal.

- Ah, porque não sou igual. Quero ser igual à fulana, igual à sicrana. 
Mas as pessoas escondem isso. 
- Ah, mas isso não é normal, Calunga? 
Que coisa triste quando a pessoa pensa assim. Penso: coitada, como vai sofrer na vida. Quanta luta para esconder a própria natureza divina dentro dela. Uai, Deus não se repete em ninguém. Se você está procurando ser normal, está contra Deus e só vai arrumar encrenca na vida. Vai, meu filho! 
- É que eu não gosto de ser diferente. Tenho medo que os outros me olhem e digam: "Ah, que mulher mais esquisita! Que homem esquisito!" 
O povo fica na vaidade, mesmo. Vive para os outros verem, para os outros não falarem. É um povo de uma pobreza, uma coisa triste que vai descolorindo a vida dele, descolorindo, desbotando e vai ficando aquela coisa velha, feia. Anda pela rua como uma alma penada. Esse povo dirige carro, come, vê televisão, mas é um povo todo desbotado, sem cor, sem vibração, sem alegria, sem entusiasmo. Todos fazendo as obrigações da vida. 
- Ah, Calunga, porque eu tenho as minhas obrigações. Sou uma pessoa responsável. 
Tudo sem cor, os olhos sem vida. 
-Ah, Calunga, sou assim, mas também todo mundo é! Então, você está pior do que eu pensei. Está numa vida ruim, triste, traindo a sua natureza. Está numa vida descolorida. E depois ainda ataca a vida:
- Ah, porque a vida é ruim, a vida é sem graça, a vida é cheia de problemas. Porque eu sofro assim, porque sofro assado. 


Calunga, "Tudo pelo Melhor".