Temos do “demoníaco” ao “divino”, entre nós. E dentro de nós. Conheço trevosos e iluminados, anjos e demônios. Vi anjos virarem demônios e vice versa, conforme as circunstâncias. Todas a falhas que vemos estão dentro de nós, em maior ou menor grau, como árvore frondosa ou apenas a semente, esperando a ocasião. As proporções variam do imperceptível ao impressionante, em incontáveis degraus.
A humanidade é um grande garimpo. O que aparece é lama, cascalho e pedra sem valor. No meio, de raro em raro, há pedras preciosas e pepitas, misturadas com tudo. Há quem desista, “ora aí só tem barro, que sujeirada”, logo de saída, ou depois de uma busca frustrante. Mas há quem se aplique, quem procure e encontre. É preciso educar os olhos, apurar os sentidos, pra perceber uma pedra de valor, uma pepita, envolvida na lama, no cascalho humano. Não é difícil, eu as tenho encontrado, sempre, em todos os meios e coletividades.
Claro que não são a regra geral. A sociedade será outra, quando forem, pelo menos, minoria. São exceções à regra. Muitas se dedicam a trabalhos de conscientização, de ensino, de amparo, de apoio, de luta por melhorias de verdade, no ser humano e na sociedade. Outras não se dedicam diretamente, estão em toda parte, espalhadas, formando a sociedade como pessoas comuns, em todas as profissões. Essas iluminam aonde estão, questionando, propondo, exemplificando. A diferença está no olhar, na compreensão das coisas, da forma de reagir, de sentir, de atuar. Há quem esteja buscando, quem não se conforme, quem sofra com a discriminação, inevitável numa sociedade onde a mediocridade, a mesquinharia, a conformação, a padronização ainda são as regras vigentes. O que vale a pena, da humanidade, são as exceções à regra. Em geral, são pessoas que, quando andam com a corrente, se angustiam, sofrem, têm a sensação de morte da alma. Pessoas para quem se conformar e reprimir as necessidades internas é adoecer a vida, é se tornar amargo, depressivo, mal-humorado, descrente de tudo.
Somos mesmo complexos e variados. Mas porque somos, também, ignorantes de nós mesmos. Cegos de consciência, tateamos no escuro, aprendendo com a dor, colhendo frutos que plantamos sem nem perceber. Aprender, essa é a tarefa da vida. Pra isso existimos e é o que levamos da vida. Alguns sabem disso, outros sentem. Poucos, é claro. A maioria anda por aí, superficializada, induzida ao desinteresse, à inércia, ao seguir as ondas, sem perceber as razões dos seus próprios valores, sem perceber os próprios condicionamentos, muitas vezes no cárcere da indiferença, do egocentrismo, do apequenamento do mundo. Não pode entender a angústia, o vazio que assalta, a cada silêncio, a cada encontrar consigo mesmo.
A preciosidade humana tem uma característica própria, única, e é o que me faz acreditar na diversidade infinita desse trabalho de lapidação. Diferente da preciosidade mineral, exclusiva, a preciosidade humana contagia. Uma luz pode acender várias, e essas passam a acender outras. A diferença entre uma pessoa iluminada e outra ignorante não é tão abissal quanto nos parece. Em essência, são a mesma coisa, às vezes um leve toque produz o brilho. Taí o trampo, esse é o trabalho. Pra mim, é isso o que faz a vida valer a pena. Aprender e passar, deixar os toques pra que alguém os aproveite em seu trabalho/caminho. Não espero ver tudo pronto, do jeito que sonho. Mas preciso andar neste sentido. Não tenho a ingenuidade de plantar pra mim, planto pra dar valor à minha vida.
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