Caridade é a disposição para o bem (1)

domingo, 3 de outubro de 2010

A vida é uma chance constante. A cada momento, há uma nova chance de poder voltar atrás no que se fez de errado e fazer de novo, de poder aprender coisas novas e resolver antigas questões. Mas a coisa melhor da vida é saber usar o breque. Você sabe usar o breque? Brecar é bom, pois não dá para a gente sair por aí sem breque.
As coisas vão ficando automáticas e a gente vai falando, pensando, sentindo sempre igual. Vive assim uma vida cheia de impulsos que a gente mesmo criou. Por isso, precisa aprender a brecar para mudar de direção, de sentido, para mudar de pensamento, de sentimento, de atitude e de ação. Pois só assim a gente pode melhorar a qualidade da nossa vida.
Cada um está na sua direção. Mas precisa aprender a prestar atenção no tráfego da vida, porque senão você ainda vai trombar muito. O povo, no entanto, não quer prestar atenção: "Ah, porque sou assim mesmo", e mete a cara. Depois, fica trombando daqui, trombando dali, porque fica com raiva do mundo. Tem gente, porém, que não pára para ver como quer dirigir o próprio carro, dirigir as próprias decisões, o que quer escolher para pensar, o que quer escolher para fazer, com que sentimentos quer continuar determinada coisa, como quer se dar com as pessoas. O povo gosta de arrumar encrenca, é muito assim:
- Ah, se essa pessoa me aprontar uma, faço logo duas. Se fez uma comigo, acabou, porque eu não tolero ...
Começa logo a trombar porque, na verdade, não quer tolerar o companheiro, não quer entender a loucura dos outros. Com isso, está sempre trombando de cá, trombando de lá, acabando com machucado, doente, na mesa de cirurgia. Arranca pedaço de cá, arranca de lá, porque a pessoa é da encrenca. E quem é da encrenca está sempre com problema, sempre com encrenca. 

Por isso, a gente precisa aprender a brecar e a dizer:
- Não, não adianta encrencar com o povo. O ser humano é o ser humano. Tem gente de todo jeito e de todo tipo. Sou eu que tenho que aprender a dirigir o carro da minha vida no meio desse povo. Sou eu que tenho que aprender a desenvolver qualidades para ter jeito de lidar com as coisas, se é que eu quero a paz; se é que eu quero viver uma vida sem ser enganado, sem me machucar, sem machucar o outro; se é que eu quero viver com a verdadeira sabedoria e não só com a esperteza.
Mas, para isso, você precisa aprender a brecar: - Espera aí. Não é assim. O povo é como é. Não adianta. - Ah, não tolero mentira, Calunga. - Uai, minha filha, precisa tolerar, porque o povo mente mesmo. O povo tem medo de dizer a verdade, é covarde. Ele se sente inferior, então mente para parecer superior. Isso é do mundo, minha gente. Não acaba assim do dia para a noite, porque se nós pudéssemos já tínhamos tirado tudo isso do mundo, mas não dá.
O povo ainda experimenta a loucura de não querer dirigir a própria mente. Ele deixa todo mundo dirigir o tráfego da vida dele, a escola, os pais, os outros todos, sem fazer uma seleção:
- Não quero mais essas coisas. Não quero mais pensar assim. Quero limpar isso, quero limpar aquilo e fazer a vida melhor para mim.
Qualquer um pode fazer isso. Pode e até deve, porque a vida está sempre exigindo que a gente se atualize, que se modernize, não nas modas. Modernizado quer dizer uma pessoa que vive o momento com toda a sua inteligência, procurando o bom, o novo, que vai aprendendo e melhorando. Mas vocês gostam de fazer drama:
- Ah, Calunga, porque eu fiz muito esforço para melhorar, porque lutei muito ... Vocês é que são dramáticos demais.
Não é verdade que Precisa fazer esforço, 
Porque a gente muda A hora que quiser e, 
Quando quer, muda Com a maior facilidade.
Minha gente, então, precisa aprender a usar o breque. Brecar não é ficar engolindo tudo goela abaixo, porque isso também não é bom. Significa aprender a fazer as coisas com jeito, aprender a se expressar com sinceridade, aprender a lidar com o povo. Mas vocês não têm boa vontade com ninguém. Gostam de bajular, de passar a mão na cabeça para fazer carinho, essas coisas meladas demais. Pensam que isso é ser bom? Isso é nadinha, é coisinha.
Bom de verdade é aquele que sabe lidar com o povo. Esse que é bom. Bom não é o que fica dando pão para pobre, que fica fazendo caridade para cima e para baixo, alimentando o povo na miséria. Isso não é bondade. Isso aí as pessoas fazem por sentimento de culpa. De medo de sentir culpa, ficam fazendo essa caridade.
Caridade de verdade, de verdade verdadeira, é aquela coisa de aprender a lidar com o povo. Você sabe lidar bem com o povo de casa? Sabe entender todo mundo, a toda hora? Tem paciência? Tem boa vontade com eles para entender o limite de cada um, a ignorância de cada um, o medo de cada um, os complexos de inferioridade? Dá para você entender e aprender a lidar com isso? Você é uma pessoa hábil? Se você não é, minha filha, então não é caridosa. É caridosa só da boca para fora:
- Ai, que pena desse. Ai, que pena daquele ...
Esse negócio aí é hipocrisia. É uma coisinha, não uma coisona de verdade. Depois, você passa o resto do tempo implicando com esse, implicando com aquele. Não quer conversar com fulana porque você está magoada. Não quer mexer com sicrano porque é perigoso. Vixe, meu Deus! É uma inabilidade para lidar com o próximo que é uma vergonha! 


Então, minha filha, que caridade é essa? Isso é só para se ver no dia de Natal? E o resto do ano, como é que faz, hein, meu filho? Você é aquela pessoa ruim, que tem medo dos outros, que trata os outros com indiferença, que critica, xinga e fala mal? Então, pare com essa vergonha de caridade no Natal, porque isso é feio até demais. É muito hipócrita.


Calunga, "Tudo pelo Melhor".